À tarde, pelo palco Ibero Sounds passaram os portugueses Mundo Cão, com o álbum homónimo de estreia e canções como «O Caixão da Razão» a ganhar adeptos - prestação alvo de recepção calorosa por parte do público - e os 6 PM. Destaque, no que toca aos Mundo Cão, para uma versão dos bracarenses Um Zero Amarelo, «Canção de Amigo».
18h45 Os Spoon saem de palco após uma bela actuação que nem a chuva conseguiu arruinar. Típica banda sem nada que a recomende, que não as excelentes cantigas, os autores de Ga Ga Ga Ga Ga são valentes: enfrentaram os cada vez mais fortes pingos de chuva e uma plateia rarefeita para fazerem canções à moda antiga, com piano (eléctrico), pandeireta e um balanço bom, muito bom.
«Don't Make Me A Target», «Don't You Evah», «You Got Yr. Cherry Bomb» e «Rhythm and Soul», todas do novo disco, foram excelentes momentos, não só de pop vaporosa como de entrosamento com o povo.
O concerto dos Spoon marcou também a mais consistente aparição, até ao momento, de gabardines no recinto. Aos enfadonhos impermeáveis azuis escuros juntam-se algumas experiências cromáticas mais arriscadas. Para proteger o penteado da chuva, vale tudo, inclusive sacos de plástico.
20h00 Os Gogol Bordello vêem-se forçados a voltar ao palco não para um encore, que o contexto de festival não permite tais veleidades, mas para uma pequena brincadeira com guitarra acústica. Objectivo: congratular o público pela eufórica participação no concerto, o mais agitado do festival até agora.
Poderá ser o cenário a influenciar o nosso discernimento mas, em comparação com o espectáculo de Sines, os Gogol Bordello terão carregado mais na tónica punk da sua música. O baterista, pelo menos, para isso trabalhou...
Líder incontestado da trupe, Eugene Hütz acabou, paradoxalmente, por diluir-se no meio do caos organizado que acontece em palco (dançarinas com bombos, violino, acordeão). De calças vermelhas e atlético tronco nu, é ele quem conduz a carroça, mas todos usufruem da boleia.
A assistir ao concerto estiveram os Spoon, abordados por vários fãs para tirarem fotografias e darem autógrafos, e os New York Dolls, que adiaram algumas entrevistas para poderem ver o show dos Gogol Bordello. Numa das zonas laterais do palco também avistámos os longos cabelos grisalhos de J Mascis, dos Dinosaur Jr.
22h15 Os australianos Architecture in Helsinki saíram de palco há uma boa meia hora e deixaram o público «contente» com a sua pop colorida. Os seis elementos presentes no concerto fizeram a festa, mudando constantemente de instrumentos (a fazer lembrar por breves instantes o que os Arcade Fire fizeram no mesmo palco há alguns anos atrás, mas sem igualarem o brilhantismo da banda canadiana).
Do alinhamento fizeram parte o divertido «It'5» e as recentes «Debbie» e «Heart It Races» - o single de apresentação do novo Places Like This , que fechou o concerto em modo festivo «electro afro». A boa disposição dos Architecture in Helsinki, mesmo em momentos mais calmos, não passou despercebida por entre as gotas de chuva que insistiram em cair.
23h20 A organização acertou em cheio nas previsões meteorológicas: chove e bem em Paredes de Coura.
Adolfo Luxúria Canibal, dos Mão Morta, não teve medo da intempérie e apresentou-se em palco num belo conjunto de calção e t-shirt. Agradecendo a «ajuda» de São Pedro, o líder dos bracarenses mostrou-se encantado com a prestação do público.
«Se eu fosse uma espécie de Papa, que não sou, diria que estais com uma auréola muito estranha, pois apesar da chuva e da lama, conseguis levantar poeira», disse a cera altura. «Sobretudo para um não-crente, é milagre!».
Enigmáticas foram as declarações de Canibal sobre este ter sido o «adeus» dos Mão Morta ao rock. Estará a banda disposta a trocar as guitarras pelos palcos do teatro?...
«Para vocês ficarem com uma memória nossa», explicou Canibal antes da despedida com «Anarquista Duval». A chuva caía copiosamente e a dúvida ficou a pairar no ar, húmida e pesada...
01h15 Depois de um curioso e prolongado linecheck, os norte-americanos New York Dolls entraram em palco com a atitude confiante de quem volta a casa (o palco, entenda-se) estampada na cara. Ressuscitada o ano passado depois de mais de 30 anos afastada do estúdio, a banda encabeçada por David Johansen veio a Paredes de Coura apresentar o álbum One Day It Will Please Us to Remember Even This , sem esquecer no entanto temas mais antigos.
«Looking for a Kiss» (a abrir), «Frankenstein», «Pills», «Private World» (dedicada ao falecido baixista Arthur Kane) e a incontornável «Personality Crisis» (já no encore) foram retiradas do baú de recordações, entre momentos blues - com harmónica a acompanhar - que rapidamente resvalaram para rock.
Do novo registo, a banda de Sylvain Sylvain (o guitarrista que, em declarações à BLITZ antes do concerto, confidenciou que Johansen é confundido com Mick Jagger em aeroportos) apresentou «We're All in Love», «Plenty of Music» e «Dancing on the Lip of a Volcano», entre outras. Ao terceiro tema, no entanto, os New York Dolls decidiram homenagear aquela que garantiram ser a sua banda preferida... Janis Joplin foi recordada com uma versão de «Piece of My Heart».
2h57 Os Dinosaur Jr estão prestes a despedir-se de Paredes de Coura. Naquela que foi a segunda passagem da banda americana por Portugal em pouco mais de dois anos, caminharam lado a lado temas do novo Beyond e «oldies» como «The Wagon» ou «Feel The Pain».
Nem a idade das canções nem a dos músicos foi, porém, relevante num espectáculo que arrancou pelas duas da manhã, debaixo de um aguaceiro de belíssimo efeito. Quem resistiu ao adiantado da hora e à chuva (e ainda houve muitos valentes!) soube aproveitar um óptimo concerto – se ao final da tarde os Spoon presentearam o Minho com pop à moda antiga, às primeiras horas da madrugada os Dinosaur Jr lembraram o indie rock como já não se faz. Bateria seca de Murph, a guitarra de J Mascis a explodir na parede de amplificadores e o baixo de Lou Barlow a pulsar pelo anfiteatro fora. Tudo soou tão estridente e certo como devia, inclusive os novos temas, escritos após quase 10 anos de separação.
«Almost Ready», «Back To Your Heart» e «This Is All I Came To Do», bem como a versão de «Just Like Heaven», dos Cure foram apresentados com a frescura das cinco da tarde e a energia dos 20 anos. Bem que Lou Barlow explicou à BLITZ, pouco antes do concerto, que o segredo do regresso bem sucedido foi mesmo a «muita energia» que o trio acumulou durante os anos em que esteve separado.
Entre canções, os Dinosaur Jr pouco comunicaram, mas Lou Barlow, o amante de gatos, ainda miou umas saudações bem intencionadas. Paredes de Coura, ou o que restava dela, ronronou de prazer.
Texto: Capitão Romance e Lia Pereira e Mário Rui Vieira @ BLITZ
Fotos: Antena 3