O 13ª arte bateu à porta dos Clã. Com um novo álbum intitulado “Cintura”, a banda nortenha anda cada vez mais nas bocas do mundo. O álbum tem lançamento previsto para Outubro. O resto… o resto é conversa:
Alexandre Quinteiro: Para começar: como surgiram os Clã?
Manuela Azevedo: Os Clã surgem em finais de 1992, convocados pelo Hélder Gonçalves e pela sua vontade de encontrar um colectivo que desse corpo a algumas canções que já tinha composto e a uma ideia de banda que, já há algum tempo, acalentava.
AQ: Ao vivo nota-se que a Manuela cruza a beleza e força da sua voz com a atitude e desinibição de uma actriz, tantas vezes demonstradas pelos seus movimentos corporais e pela forma exuberante como, durante toda a actuação, namora o par de microfones. Sente-se uma actriz?
MA: Uma actriz, no sentido “profissional” do termo, não. É preciso muito saber para se ser Actriz. Mas é verdade que muitas vezes me projecto noutras personagens para melhor encontrar a interpretação mais justa para a canção.
AQ: Uma pergunta que faço sempre: Porquê Clã?
MA: Entre vários nomes das várias listas que fizemos para descobrir o nome da banda apareceu esta palavra – pareceu-nos logo a melhor! Reflectia perfeitamente o que queríamos ser – um colectivo, uma “família”, com raízes fortes e a vontade de percorrer juntos um longo caminho.
AQ: Que nomes é que gostariam de ver, futuramente, a colaborar com os Clã?
MA: É certo que, neste anos, já tivemos o privilégio de colaborar com artistas que admirávamos muito (Carlos Tê, Sérgio Godinho, Arnaldo Antunes, Adolfo Luxúria Canibal, Mário Barreiros, Regina Guimarães, entre outros). Mas há ainda muita gente que admiramos e que adoraríamos um dia encontrar num palco ou no estúdio. Por exemplo: Caetano Veloso, Marisa Monte, David Byrne, Tom Waits e muitos mais!...
AQ: Começando pelos registos discográficos, estão prestes a lançar o quinto álbum de estúdio. Que alterações introduziram neste disco relativamente ao “Rosa Carne”? Porquê “Cintura”?
MA: Liricamente, o novo álbum é uma continuação de “Rosa Carne”. Musicalmente, “Cintura” é mais físico, mais rítmico, menos operático que o álbum anterior. A mulher da capa do “Rosa Carne” deixou os veludos e memórias do seu “boudoir” e, de malas leves, saiu para a rua.
Escolhemos o título “Cintura” porque a palavra nos pareceu, sonora e graficamente, bonita. Depois, porque, semânticamente, sentimos que é uma palavra próxima do movimento, da dança, do feminino, do “jogo de cintura” que se sente no novo disco.
AQ: E, caso possam revelar tal informação, mantiveram-se fiéis ao vosso género musical ou “Cintura” veio arriscar novas paradas?
MA: A nossa vontade, sempre que fazemos algo novo, é também experimentar – novos sons, novas formas de compor canções, novas palavras... E, nesse sentido, sentimos que esta é uma “nova parada”. Mas é claro que continuamos a fazer canções cantadas em português. Se esse é o nosso género, mantivemos-nos fiéis.
AQ: Uma banda portuguesa, de nome e já com 5 álbuns de estúdio. Já têm uma boa história para contar aos fãs, e não dão sinais de parar com o excelente trabalho. Que “estórias” mais vos marcaram ao longo destes anos sob o nome Clã?
MA: Muitas histórias! Concertos, encontros, canções.. O dia em que nos ouvimos pela primeira vez na rádio, a chuva no concerto em Vilar de Mouros, a estreia de “Música para Nosferatu”, no Rivoli, as viagens...
AQ: Sei também que já deram concertos fora do território português. Qual é a sensação de actuar perante um público dissemelhante do nosso? Qual a reacção dos espectadores?
MA: É um desafio muito interessante e estimulante. E a reacção dos espectadores fora de Portugal tem sido também de grande interesse e curiosidade pela música que fazemos. Mesmo que não compreendam as palavras, são sensíveis às emoções que as canções encerram.
AQ: Há alguma situação caricata que queiram partilhar com os leitores?
MA: Há uns anos atrás, num showcase numa loja de discos, o palco onde tocávamos partiu-se a meio de uma canção (“A grande Pirâmide”, se bem me lembro). Apesar do susto, conseguimos tocar a canção até ao fim, sem interrupções.
AQ: O que sente a banda ao subir ao palco? De que falam e o que pensam no backstage (quando existe…)?
MA: Não temos nenhum ritual para subir ao palco. Muitas vezes vamos a falar sobre o concerto, a “afinar” um ou outro pormenor. Outras vezes, continuamos a conversa, mais ou menos trivial, que decorria no camarim, antes da chamada para o palco.
AQ: Tony Madley disse que… “Fazer discos e dar espectáculos vicia como uma droga”. Sentem isso?
MA: Sim, em certa medida são experiências viciantes. Felizmente, os efeitos secundários não são tão graves!...
AQ: Porquê o baixo piccolo e não a normal guitarra?
Hélder Gonçalves: O instrumento que tocava antes de começarem os Clã era o baixo (e contrabaixo). Primeiro começamos por usar 2 baixos mas depois senti necessidade de ter um instrumento mais agudo nos arranjos. Por isso fui adaptando baixos com cordas mais finas, com electrónica de guitarra, amplificadores de guitarra, pedais, e.t.c., até chegar ao baixo Piccolo.
Entretanto tenho continuado a fazer experiências com afinações pelo que prefiro agora chamá-los Transbaixos (designação que roubei ao meu amigo Vitorino). No fundo gosto de guitarras com 4 cordas.
AQ: Qual é o balanço final que fazem do projecto Humanos?
MA: Foi uma bela história! Um projecto para um disco que cresceu para lá das nossas melhores expectativas e que deu muitos frutos: concertos, disco e dvd ao vivo e, principalmemte, trouxe de novo à ribalta a música e e personalidade de António Variações.
AQ: Como atentos e ávidos consumidores de música (como suponho que sejam), que lançamentos actuais vos despertam maior interesse (tanto no espectro nacional como internacional)?
HG: Of Montreal; Tinariwen; Ryan Adams; The Flaming Lips; Queens of the Stone Age; Arcade Fire; TV on the Radio; Midlake; ; LCD Soundsystem; PJ HARVEY; Jorge Palma; David Fonseca...
AQ: Através da letra de “O Meu Estilo”, surgiu-me uma questão relacionada com a forma como as multinacionais da indústria têxtil estão a pegar em vários estilos ligados à música e a “vestir”, por assim dizer, adolescentes e pré-adolescentes. É muito comum encontrar rapazes e raparigas com pulseiras de picos, roupas com caveiras e outros acessórios, convictos de que são Punks ou Emos, embora desconheçam por completo os valores, as raízes ou mesmo as bandas que mais se notabilizam nessas correntes. Será um simples desejo de afirmação ou é, mais uma vez, o mercado a tentar moldar mentalidades? MA: O desejo de afirmação e de pertença a uma tribo especial é sintomático da adolescência. Mas os insidiosos mecanismos da sociedade de consumo sabem bem como transformar esses desejos em lucro... E todos sabemos que o mercado prefere o acessório ao essencial.
AQ: Bem, venceram o Globo de Ouro para “melhor música” com a canção “Sopro do Coração”. Como “soprou” o vosso coração quando souberam da notícia?
MA: Ficámos contentes com o reconhecimento que a canção conquistou. Mas confesso que os (já extintos) prémios Blitz mexiam mais com o nosso coração!...
AQ: Para concluir, o que diriam a quem pegasse no vosso novo CD e o colocasse pela primeira vez na aparelhagem?
MA: Ouve.
AQ: Bem, chegámos ao fim. Agora só tenho que agradecer imenso a vossa colaboração e disponibilidade para esta entrevista. Obrigado e até breve!
MA: Até sempre! Um grande abraço dos Clã!
Esta entrevista foi dada em exclusivo para o 13ª Arte.